As cidades adoecem-nos. O aumento da urbanização tem afetado negativamente a saúde física e mental do ser-humano.
Os seres humanos e a natureza sempre estiveram conectados. Nós evoluímos conectados com a Terra, mas parece que, por vezes, nos esquecemos desse facto. No entanto, os nossos corpos e a nossa biologia, não. Ao longo de 200.000 anos na Terra, desenvolvemos uma forte relação com a natureza, vivendo em ciclos alinhados com o dia e a noite, o calor e o frio, o plantio e a colheita. Esta conexão acontece de tal forma que mantém o contacto com a natureza gravado nos nossos genes. No entanto, à medida que a nossa civilização foi evoluindo, esqueceu-se disso, de tal forma que só vamos à praia ou à montanha para nos distrairmos ou passear. Se procuramos um estado de saúde e bem-estar, o contacto com a natureza não é uma opção, mas sim uma obrigação.
A natureza é um medicamento. Quando nos conectamos com a natureza, somos expostos a uma série de desafios que despertam em nós respostas biológicas de “anti-fragilidade”. Por exemplo, caminhar em terrenos acidentados ou em montanhas pode aumentar a nossa resistência física, estimulando o nosso sistema cardiovascular e melhorando a nossa capacidade pulmonar. Além disso, a exposição à luz solar pode ser uma fonte de vitamina D, que é importante para a saúde óssea e a regulação hormonal.
Mas os benefícios da natureza não se limitam apenas à saúde física. A natureza também é capaz de melhorar a nossa saúde mental. Estudos científicos têm demonstrado que caminhar num ambiente com natureza envolvente pode reduzir a ansiedade e o stress, promovendo uma sensação de calma e relaxamento. Além disso, a natureza pode ajudar a aumentar a nossa criatividade e melhorar a nossa capacidade de concentração.
Com os avanços da medicina, automação e abundância de alimentos, houve um aumento na qualidade de vida e na esperança média de vida. No entanto, o tempo livre agora é consumido por uma corrente interminável de atividades e programas numa era de ciclos cada vez mais curtos e sobrecarga de informações, levando a altos níveis de stress.
A solução parece ser simples: reconectar com a natureza e connosco. Mas como podemos fazer isso num mundo de funcionários de escritório e vidas na cidade? É simples, envolva-se na natureza. Uma forma simples é através do Shinrin-yoku, uma técnica tradicional japonesa que associa as florestas à saúde humana.
O Shinrin-yoku pode ser definido como o ato de se expor a ambientes florestais, usando conscientemente os cinco sentidos na floresta para obter um relaxamento mental e físico. Já Hipócrates (considerado o Pai da Medicina) falava em “ares, águas e lugares” para o bem-estar físico e mental.
Alguns efeitos conhecidos do contato com a natureza são a diminuição do stress e dos sintomas associados, como ansiedade, dores de cabeça, alergias, tensão e fadiga, além da diminuição do ritmo cardíaco e da tensão arterial. Outros efeitos são o reforço do sistema imunitário, o aumento da resistência do corpo contra as doenças e a sua capacidade de lutar contra elas, a diminuição do tempo de recuperação, a preservação das reservas de energia, o reforço da capacidade física, resistência e vitalidade, a melhoria da concentração, essencial às capacidades de aprendizagem, produtivas e criativas, a contribuição para o relaxamento e a melhoria do sono e o crescimento da afetividade positiva. Vejamos alguns estudos:
- Um estudo publicado na Environ Health Prev Med em 2010 investigou os efeitos fisiológicos de estar em ambientes florestais, numa prática conhecida como Shinrin-yoku ou “banho de floresta”, em comparação com ambientes urbanos. Os investigadores realizaram experiencias de campo em 24 florestas no Japão, medindo a resposta fisiológica dos participantes enquanto caminhavam cerca de 2 a 4 horas. Os resultados mostraram que em ambientes florestais os indivíduos apresentaram níveis mais baixos de cortisol, uma hormona relacionado com o stresse, em comparação com os ambientes urbanos. Além disso, a frequência cardíaca, a pressão arterial e a atividade nervosa simpática (responsável pela resposta de luta ou fuga) foram menores nos ambientes florestais, enquanto a atividade nervosa parassimpática (responsável pelo relaxamento e recuperação) foi maior. Estes resultados sugerem que a exposição a ambientes naturais pode ter efeitos positivos na saúde e bem-estar, reduzindo os níveis de stresse e melhorando a recuperação.
- Uma revisão sistemática médica publicada na Environ Health Prev Med em 2019 analisaram 27 estudos publicados entre 2007 e 2018, envolvendo um total de 3.140 participantes. Os estudos incluíram diferentes tipos de intervenções em ambientes naturais, como caminhadas na floresta, atividades de jardinagem, meditação em ambientes naturais, entre outros. Os resultados da revisão sistemática sugerem que o Shinrin-yoku pode ter efeitos positivos na saúde física e mental, incluindo redução do stresse, melhoria do humor e do sono, diminuição da pressão arterial e da glicemia, além de aumentar a imunidade. A revisão sugere que que o Shinrin-yoku pode ser uma prática promissora para melhorar a saúde e o bem-estar.
- Outro estudo publicado em 2022 na Int J Ment Health Addiction em que os autores analisaram 52 estudos, incluindo um total de 4.121 participantes. Os resultados da meta-análise indicaram que a exposição à natureza, incluindo Shinrin-yoku e terapia da natureza, está associada a melhorias significativas na saúde mental, incluindo reduções nos sintomas de ansiedade, depressão e stresse. Além disso, a terapia da natureza parece ser especialmente eficaz para reduzir os sintomas da ansiedade.
- Outro estudo publicado em 2022 na International Journal of Environmental Health Research em que os autores analisaram 17 revisões sistemáticas e meta-análises, incluindo um total de 57 estudos. Os resultados da revisão sugerem que o Shinrin-yoku pode ter efeitos positivos no bem-estar psicológico, incluindo redução do stresse e ansiedade, melhoria do humor e aumento da sensação de felicidade. Além disso, o Shinrin-yoku também pode ter efeitos positivos na saúde física, incluindo redução da pressão arterial, melhoria da função pulmonar e aumento da imunidade.
Existem várias formas de contato com a natureza, como a observação da floresta, seja no meio dela ou observar um grande quadro com natureza, e a caminhada na floresta, também conhecida como método Grounding, que é o contato direto com a terra, relva, areia ou água do mar.
Reconectar com a natureza é uma maneira eficaz de melhorar a saúde física e mental. Incluir o contacto com a natureza na sua rotina diária pode trazer melhorias significativas, como a diminuição do stress, a melhoria da autoestima e o aumento das funções cognitivas. A natureza é um medicamento gratuito e disponível para todos, e pode ser uma fonte valiosa de cura e bem-estar.
David Brandão | Osteopata – Fisioterapeuta
Integrativa | A saúde e o bem-estar como um estilo de vida
Artigos de referência
- Park BJ, Tsunetsugu Y, Kasetani T, Kagawa T, Miyazaki Y. The physiological effects of Shinrin-yoku (taking in the forest atmosphere or forest bathing): evidence from field experiments in 24 forests across Japan. Environ Health Prev Med. 2010 Jan;15(1):18-26. doi: 10.1007/s12199-009-0086-9. PMID: 19568835; PMCID: PMC2793346.
- Wen Y, Yan Q, Pan Y, Gu X, Liu Y. Medical empirical research on forest bathing (Shinrin-yoku): a systematic review. Environ Health Prev Med. 2019 Dec 1;24(1):70. doi: 10.1186/s12199-019-0822-8. PMID: 31787069; PMCID: PMC6886167.
- Kotera, Y., Richardson, M. & Sheffield, D. Effects of Shinrin-Yoku (Forest Bathing) and Nature Therapy on Mental Health: a Systematic Review and Meta-analysis. Int J Ment Health Addiction 20, 337–361 (2022). https://doi.org/10.1007/s11469-020-00363-4
- Hansen MM, Jones R, Tocchini K. Shinrin-Yoku (Forest Bathing) and Nature Therapy: A State-of-the-Art Review. International Journal of Environmental Research and Public Health. 2017; 14(8):851. https://doi.org/10.3390/ijerph14080851
- Antonelli, M., Barbieri, G. & Donelli, D. Effects of forest bathing (shinrin-yoku) on levels of cortisol as a stress biomarker: a systematic review and meta-analysis. Int J Biometeorol 63, 1117–1134 (2019). https://doi.org/10.1007/s00484-019-01717-x
- Wen, Y., Yan, Q., Pan, Y. et al. Medical empirical research on forest bathing (Shinrin-yoku): a systematic review. Environ Health Prev Med 24, 70 (2019). https://doi.org/10.1186/s12199-019-0822-8